quarta-feira, agosto 14, 2002

Não existe. Não ter que ter medo. Uma coisa que não existe, não pode vir a tona. No momento em que Pandora fechou sua caixa, ela ficou condenada ao escuro, ao limbo. A única dádiva de Zeus em meio a tantos catástrofes que, por inveja, nos foram dadas. Fechada, lacrada, inacessível para os pobres humanos, condenados por um crime que não cometeram. Por aceitarem o fogo, dádiva de Prometeu. Mas, a despeito do que se esperava, ela surgiu no coração dos homens, uma provável cria dos males enviados por Zeus. Mas era fraca e mortal como o coração dos que a possuiam, e logo fenecia. Talvez isso tivesse sido planejado pelos olimpícos, talvez fosse só um golpe de sorte. Porque os homens se agarravam a ela como último fio pendurados num abismo. E esse fio, fino como os cabelos da lua, se rompia facilmente. E, nesse momento, os homens cumpriam o mesmo destino que foi dado a Prometeu: Acorrentados num abismo, sentiam a dor de terrem o fígado devorado por abutres durante o dia, regenerar-se a noite para serem devorados novamente no dia seguinte. Num suplício sem fim. Suplicando para partirem as correntes e caírem no abismo e no fim da dor. A vingança de Zeus estava completa. Não. Não há mais. E mesmo a que há, é só um adiar da dor. Melhor seria largar o fio antes que se parta. Larguei. Caí. Dávida? Não era uma dávida. Era uma ironia macabra. Era incendiar o coração com o próprio fogo pra vê-lo extinto duma vez. E rir-se dele. E o frio se abateria, implacável. E a escuridão dominaria. E erraria-se cego pelo mundo. Não. Realmente, ninguém merece. "Pelo menos sobrou o fogo.", diriam os incautos. Mas, ironia das ironias! esse queima o peito e o devora e o regenera e o devora e o regenera e o devora e o regenera. Esquenta o frio, mas derrete a alma. Trás luz, mas cega. Não. Ela não existe. Ficou perdida, numa caixa perdida, por um ser perdido, destinada a corações perdidos. Rezemos para que permaneça perdida. Para que o fogo extinto não arda em nosso peito. Para que os abutres não devorem nossos fígados. Para que não nos iludamos. Não. Ela não existe. Não tenha medo. Nunca, nesse caso, não é tempo demais. Obrigado Pandora.

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